segunda-feira, 23 de setembro de 2013
Novo procurador critica 'autismo' e falta de transparência da gestão Gurgel
Sobre 'Mensalão Tucano', engavetado pelo
antecessor, Rodrigo Janot diz que
trabalhará para evitar prescrições de penas
Para Janot, Procuradoria Geral da República deve
dialogar mais com outros poderes
São Paulo – Em entrevista concedida aos repórteres
Felipe Recondo e Andreza Matais, para o jornal O Estado de S. Paulo, o novo
Procurador Geral da República, Rodrigo Janot, deixou claro que está disposto a
imprimir ao Ministério Público Federal um ritmo menos partidarizado e mais
transparente do que seu antecessor no cargo, Roberto Gurgel. Ele critica o
“autismo” que tomou conta do órgão não gestão passado, devido ao que ele chama
de falta de diálogo com os demais poderes, e se recusou a classificar o chamado
mensalão como “maior escândalo de corrupção da História do Brasil” – como fazia
Gurgel. Para Janot, “toda corrupção é ruim”. O importante a destacar, segundo o
novo procurador, é que houve
investigação e julgamento, o que contrasta com a ideia de suposta impunidade.
Perguntado se vai acelerar o processo que tratada do chamado Mensalão Tucano,
que ocorreu em Minas Gerais nos governos Fernando Henrique Cardoso e Eduardo
Azeredo, ambos do PSDB, Janot respondeu: “Pau que dá em Chico dá em Francisco”.
Abaixo a íntegra da entrevista publicada:
O processo do mensalão está acabando. O senhor vai
acelerar o processo do mensalão mineiro?
Pau que dá em Chico dá em Francisco. O que posso
dizer é que, aqui na minha mão, todos os processos, de natureza penal ou não,
vão ter tratamento isonômico e profissional. Procuradores, membros do
Ministério Público e juízes não têm processo da vida deles. Quem tem processo
da vida é advogado. Para qualquer juiz e para o Ministério Público todo
processo é importante.
O crime de formação de quadrilha no mensalão
mineiro já prescreveu. O senhor vê novos riscos?
Uma das minhas formas de trabalho aqui é dar a
prioridade a qualquer processo com risco iminente de prescrição. Isso é buscar
efetividade da justiça.
O senhor já disse que não deve pedir prisão
imediata dos réus do mensalão. Mas vai agilizar os pareceres aos embargos
infringentes?
Eu tenho de esperar o acórdão. Vou me desincumbir
do que tenho de fazer o mais rápido possível. Mas não posso dizer se vou usar o
prazo todo ou não. Vai depender do acórdão. Eu vou inclusive usar o recesso.
Não vou tirar férias.
O senhor considera que o julgamento do mensalão foi
um marco contra a impunidade?
Não. Eu tenho muito receio de dizer que um processo
é um marco contra a impunidade, que é marco disso ou daquilo. Eu espero que isso
contribua, dentro de um contexto maior, para que todo o processo chegue ao
final com o resultado que a lei prevê. Será que esse é o grande marco? Não sei
se é o grande marco. Eu olho pra trás e vejo que este julgamento, há 20 anos,
não teria ocorrido, não existiria o processo. Essa tem que ser a grande
mudança.
Por que não haveria processo há 20 anos?
Havia uma resistência a se aplicar igualmente a lei
para todo mundo. Hoje a República é mais República.
O senhor comunga da ideia de que foi o maior escândalo
da história do País?
O que é maior? Receber um volume de dinheiro de uma
vez só ou fazer uma sangria de dinheiro da saúde, por exemplo. São igualmente
graves, mas eu não consigo quantificar isso. Não sei o que é pior. Não sei se
este é o maior caso de corrupção, não. Toda corrupção é ruim.
Talvez pelo envolvimento da cúpula de um governo.
E a (corrupção) difusa? Envolve também muita gente.
Dinheiro que sai na corrupção falta para o atendimento básico de saúde,
educação e segurança pública. Toda corrupção é ruim.
O senhor já disse que não defende a prisão agora
dos condenados do mensalão com novo julgamento. E os demais?
]Para esses, transitando e julgando a prisão é
decorrente. Para os demais (que terão um segundo julgamento), só depois da
publicação do acórdão.
O senhor defende a extinção do foro privilegiado ou
a mudança poderia gerar mais impunidade?
Quanto mais se sobe o foro, mais diminui a revisão
dos julgados. Se você diminui a revisão do julgado, maior é o risco de ter
erro. Essas questões têm que ser colocadas de maneira clara na mesa para
discutir esse assunto.
O senhor disse que tem disposição ao diálogo. Isso
tem a ver com pessoas que o senhor investigará?
Investigação não é diálogo. Falo de relação
institucional entre poderes.
Esse diálogo faltou nos últimos anos?
O Ministério Público se fechou. Virou uma
instituição autista. Diálogo não é composição. Se eu tiver de investigar, eu
vou investigar. Eu sou mineiro ferrinho de dentista.
Como o senhor pretende acelerar processos que estão
no Ministério Público?
Vou dar maior transparência às questões que
tramitam no gabinete do procurador-geral. A sociedade brasileira tem direito de
saber o que tem aqui dentro, como tramitam os processos e os prazos. Eu quero
abrir o gabinete. Minha segunda meta é acabar com os processos que ficam na
prateleira. O acervo é a massa do diabo. Não podemos ter medo de arquivar e de
judicializar.
O senhor é a favor de flexibilização das regras
para criação de novos partidos?
Não temos que flexibilizar. Temos que cumprir a
lei. A lei fixa os requisitos para a criação dos novos partidos. Nós temos que
ver se os requisitos foram cumpridos. Ponto.
O senhor enviará proposta ao Congresso para
diminuir benefícios salariais para os membros do Ministério Público, como
auxílio-moradia ou licença prêmio?
Eu discuto o estatuto (do Ministério Público) como
um todo. Para que eu possa enviar uma proposta cortando o que está previsto no
estatuto, tenho que negociá-lo como um todo. Duvido que qualquer colega meu não
deixe de trocar privilégio pela garantia de investigação.
Outros procuradores-gerais da República já saíram
com a pecha de engavetador e prevaricador. O sr. quer deixar qual marca?
Quero deixar uma marca: simplicidade. Só.
©SÉRGIO LIMA/FOLHAPRESS
Assinar:
Postagens (Atom)